Chávenas, panelas, retratos e lentes

Esse amor me surgiu aos bocadinhos e de forma crescente. Na infância, por volta dos 7, ao preparar o pequeno almoço pra mim pra meu irmão, descobri que gostava das chávenas e das colheres. Já na adolescência, aproveitando as férias dos meus pais, descobri o prazer de preparar o primeiro molho de tomate. No seminário, ao domingos, com o refeitório fechado, caia na tentação de aprimorar as receitas com macarrão instantâneo. Hoje, numa relação mais madura e estável, não imagino minha vida sem ela, a cozinha.

Quando conheci a Lorena, ela também já tinha uma outra paixão. A fotografia, é claro! Mas desde o primeiro encontro, ficou claro a afinidade entre nós e "os nossos mundos". A culinária é uma arte que, além de refletir fatores familiares e regionais, dialoga com outros aspectos culturais como a religião ou determinadas posições filosóficas, como o vegetarianismo e o veganismo. Acreditamos que a fotografia, tanto como arte, como registro histórico, até mesmo como "prestação de serviço", também reflete características e expressões culturais de todos os envolvidos nela.

Esses dias estávamos falando sobre a vida e seus diversos sentidos. Gostamos de pensar nela como um grande e colorido tapete. Como distintos fios que se entrelaçam e formam uma arte bela e coesa.  Nossa fotografia tenta representar, em texturas, cores e expressões faciais, aquilo que faz qualquer pessoa feliz: uma mesa farta, a companhia de pessoas queridas e uma boa música. Por isso decidimos compartilhar, com todas as pessoas que nos acompanha, os diversos ângulos desse par e dessa vida a dois.

Esse primeiro relato teve muito disso. Nosso amigo luso-hispânico, senhor Joaquim Princez Vargas, ao nos contar sobre sua infância, dedicou afeto especial à açorda, sopa alentejana a base de alho, azeite, água em ebulição e pão. Em sua homenagem, e na tentativa de "entrelaçar" o Alentejo com a Bahia, criamos a "açorda baiana" para acompanhar "moqueca alentejana". Na açorda trocamos o azeite de oliva pelo de dendê, e a água pelo leite de côco. Na moqueca em substituição ao dendê, incluímos o azeite de oliva tingido com páprica e no lugar do coentro, colocamos a folha de louro.